Em segundo romance, paulistana Regiane Folter aborda a superação dos traumas causados pela violência contra a mulher
"Algo instintivo em Maria lhe dizia que estava errada. Não era somente aquele punhado de documentos que Mariana tinha deixado atrás de si; ela tivera uma vida breve, mas com certeza havia deixado vestígios da mesma. Outras fotografias, conversas, bilhetinhos trocados na sala de aula, brinquedos, bibelôs, roupas, declarações apaixonadas em redes sociais, discussões, enfim. Rastros de toda uma vida. E agora cabia a ela, Maria, encontrá-los para poder contar a história daquela jovem."Trecho da orelha de "Mulheres que não eram somente vítimas"
Uma adolescente morre em um trágico acidente. Ou, pelo menos, é essa a história que tem mais credibilidade. Uma jornalista, porém, desconfia da narrativa e descobre que, na verdade, ela encobre um histórico de violências que culminaram na morte da jovem. Revoltada, a jornalista passa a lutar pela voz e pela justiça da menina, percebendo que a tragédia também a atravessa de alguma forma.
Esta é a sinopse do segundo romance da jornalista Regiane Folter (@regianefolter), "Mulheres que não eram somente vítimas" (Editora Folheando, 124 pág). Partindo da investigação da jornalista Maria Silva, determinada a resgatar a história e o legado de Mariana Tavares, adolescente vítima de feminicídio, o livro busca discutir as feridas da violência masculina — que atravessa todas as mulheres — ao mesmo tempo em que propõe o direito das vítimas à uma narrativa complexa, que não se resumem apenas aos crimes ou abusos que sofreram.
“Nos últimos anos aprendi mais sobre o que é ser mulher na nossa sociedade, e quanto mais entendo as falhas dessa estrutura machista patriarcal que nos rodeia, mas indignada me sinto. Quero mudar as coisas, quero viver em um mundo mais igualitário”, aponta a autora. “Esse livro surgiu como uma forma de sintetizar o que sinto sobre esses temas e como me afetam, e também simboliza minha luta interna e externa contra a violência contra a mulher.”
Em "Mulheres que não eram somente vítimas" aparecem também as temáticas das violências pequenas e cotidianas contra a mulher (que partem do mesmo princípio patriarcal que os abusos e crimes mais severos sofridos por Mariana) e as amizades e redes de apoio entre mulheres. “Esse livro simboliza muitas coisas nas quais acredito e que tento aplicar no meu dia a dia. Também é uma homenagem à mulher que sou e às mulheres que me apoiaram e me ensinaram tanto”, frisa Regiane. “Não somos aquilo que fazem conosco. Podemos ser mais do que nossos traumas ou momentos de dor. Precisamos mudar a forma como a sociedade espera que nos comportemos de acordo com nosso gênero.”
Trata-se do primeiro romance policial da autora, que nunca havia escrito um livro de mistério. “Sempre fui fã desse tipo de história, acho que me inspirei a partir de outros autores e autoras que li com essa mesma pegada, desde a clássica Agatha Christie, passando pela escrita cru e dolorosa da Gillian Flynn e as novelas intrigantes de Hugo Borel”, elenca. Regiane também se vê influenciada pelos escritores Camila Sosa Villada, Rupi Kaur, Aline Valek, Luis Fernando Veríssimo, entre outros.
A escrita como hábito: conheça a autora de "Mulheres que não eram somente vítimas"
Nascida em São Paulo, capital, Regiane Folter morou em Caraguatatuba (SP), Bauru (SP) e, desde 2014, vive em Montevidéu, no Uruguai. É jornalista com formação pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e trabalha com comunicação e marketing em empresas uruguaias, especialmente no setor de desenvolvimento de software.
Sempre gostou de escrever, mas decidiu levar a literatura mais a sério em 2017, quando passou a publicar de forma semanal no Medium. Em 2021, começou a publicar no Substack também, em uma newsletter de formato mensal. No ano de 2020, publicou de forma independente seu primeiro livro, "AmoreZ", em português e espanhol, que está disponível em livrarias argentinas, brasileiras e uruguaias e também em e-book pela Amazon.
"Mulheres que não eram somente vítimas" foi escrito durante a pandemia. “Escrever esse livro durante o período sombrio foi um salva-vidas; era algo positivo que fazia todos os dias e que me deu um norte naquele momento tão difícil. Acho que fortaleceu minha esperança de que tudo pode melhorar, por mais terrível que seja o que estamos vivendo”, analisa.
Confira um trecho do livro:
"O último anexo era uma fotografia de Mariana que tinha sido impressa pela família Tavares e colada em vários postes no bairro onde moravam. Nela, a garota de quinze anos sorria, tão jovem e, ao mesmo tempo, tão segura de si. Tão ingênua. Esse anexo Maria não se atreveu a fechar rapidamente e observou com atenção o rosto fresco, os olhos alegres, a esperança que reluzia naquela imagem. Era somente uma garota cheia de vida e energia, alguém que com certeza tivera sonhos e se sentira a dona do mundo, daquela maneira que só os adolescentes sabem fazer. Mariana tinha passado rapidamente desse ápice de juventude e força para se tornar um corpo abandonado em uma piscina. Tinha sido tanto e agora estava morta. A ideia de compreender a ironia por trás desse acontecimento infeliz atraia Maria, mas ela simplesmente não conseguia pensar em se aprofundar naquela história. Enquanto encarava os olhos alegres de Mariana na foto, ela sentia o vazio dentro dela duplicar de tamanho. Todos aqueles sonhos, toda aquela ilusão, já não existiam. De Mariana, tudo que tinha sobrado eram relatórios frios e uma fotografia em preto e branco."
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